quarta-feira, 8 de junho de 2011

Foi há cinquenta anos...



ANGOLA, 1961


Encontra-se nas bancas um número especial da VISÃO-História (Nº. 12 Junho 2011) totalmente dedicado ao início da guerra colonial.


Três, das suas 122 páginas, são dedicadas à C. ART. 87, que foi para Angola em 21 de Abril de 1961 em missão de soberania, logo no início dos acontecimentos.


Na página 78, reproduzida acima, vem a minha foto de camuflado, cuja legenda tem, erradamente, o nome do meu ex-camarada de armas, António Gomes que se encontra em Oakville no Canadá.


Por iniciativa da VISÃO, fomos os dois entrevistados para contarmos a nossa história da ida à guerra, entre muitos outros ex-combatentes.


Para quem tiver interesse em conhecer melhor vários aspectos da guerra colonial, ainda desconhecidos, tem oportunidade de o fazer agora, adquirindo este número especial, profusamente ilustrado, com depoimentos pessoais de quem teve encontros marcados com o destino, numa guerra que muitos de nós ainda não esqueceu.


Transcrevo a seguir, parte do meu depoimento dado à estampa nas págs. 79 e 80, pela jornalista Teresa Campos:


(…) "José Fadigas da Silva cumpria o serviço militar na Figueira da Foz quando foi avisado de que iria para Angola “em marchas forçadas”, e também levava na cabeça essa ideia de cumprir um dever: “Olhe, veja aqui”, diz, enquanto desdobra um exemplar de A Voz da Figueira, onde se lê que iam “reforçar as forças militares para pôr termo à onda de banditismo numa portuguesíssima província ultramarina, onde tem corrido muito sangue em defesa dos legítimos direitos da nossa soberania”. Comenta: “Era o que sabíamos”.


Celebrou os 22 anos a meio da travessia no dia 27 de Abril de 1961. Antes de sair de Luanda, não tinha como adivinhar o cenário que o esperava: itinerários de terra batida, árvores a caírem sobre as picadas, espectáculos dantescos nas fazendas atacadas. “Fomos render a 6ª Companhia de Caçadores Especiais que tinha ido de avião, da qual fazia parte o famoso alferes Robles, a que se atribuiu a máxima “Estamos em guerra, primeiro mata, depois pergunta”. Assim fizeram. Multiplicavam-se na guarda às fazendas e acudiam quando havia pedidos de socorro.


Uma vez, pararam na orla da floresta, frente a um campo de capim. Sentaram-se no chão para tomar o pequeno-almoço quando viram que surgia um carreiro de terra batida.
“Fui ver e ao fazer a curva esbarrei num negro. Oiço fogo nas minhas traseiras e, numa rajada, ele caiu. Depois, um outro militar deu-lhe o tiro de misericórdia.” José Fadigas da Silva remata que atirou a arma para o chão. “Não gostei de ver”. Avançaram mais uns 500 metros e encontraram a sanzala. O ex-soldado não entra em pormenores. Diz apenas: “Nós fomos de cara lavada cumprir uma missão”. Houve coisas que não gostei de fazer…”


Só um ano depois é que voltou a ver asfalto, quando regressou para o Golungo Alto, mais perto de Luanda. “A glória da guerra é sair de lá vivo.”
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(...)"Em maio de 1963 tanto António Gomes como José Fadigas da Silva regresssaram à metrópole. "Senti-me completamente deslocado, desvairavam-me as perguntas: "então, quantos mataste?", e adivinhava-se a indignação na voz de António Gomes, o português radicado no Canadá. Faz-se um breve silêncio do outro lado da linha. "Em combate nunca se sabe bem o que acontece".

(Clicar na foto para zoom)

3 comentários:

  1. Caro Fadigas,
    Nao creio que no momento que Portugal atravessa, os portugueses estejam interessados em reviver o passado. Esta cronica sobre a nossa ida a Angola, servira apenas creio eu, como assunto de curiosidade passageira e a revista sera metida no fundo da gaveta. Nao e que esteja cheio de pensamentos negativos, mas pelo que me e dado a observar ( por favor corrige-me se eu estiver errado, pois estando longe posso pecar por ignorancia) lendo jornais e falando com algumas pessoas ai residentes, nao sao muitos os historiadores, e muito menos os portugueses ( le politicos) que estejam interessados em revelar as geracoes futuras a razao ou as razoes pelas quais nos lutamos em Angola e nas outras provincias ultramarinas. Ou menos ainda, a razao ou as razoes pelas quais nos "abandonamos" essas ditas provincias. Nao estao interessados em divulgar a estupidez e nomes de politicos envolvidos na "descolonizcao" que ainda hoje sao figuras pseudo proeminentes na politica actual portuguesa.

    Enfim, isto e so um desabafo.

    um abraco,

    A Gomes

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  2. Caro Gomes
    Um desabafo que não será compreendido por muita gente, mas que é o que muitos dos que por lá andaram, ainda sentem. Mas não vale a pena agarrarmo-nos demasiado ao passado, nem fazer muitas recriminações.
    Abraço retribuído.

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  3. A série "A Guerra" de Joaquim Furtado é para nós muito importante (aqueles que não viveram a Guerra), tal como este número da visão.
    Obrigado pela chamada de atenção.

    João Vaz

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